Em consonância com a conjuntura política do país, mulheres foram às ruas em vários estados no dia 8 de Março, Dia Internacional da Mulher. De norte a sul, marcharam em defesa dos direitos conquistados ao longo de séculos, contra as persistentes desigualdades e contra a violência de gênero, o machismo, e outras formas de dominação que pressupõe o modo de produção capitalista.
A secretária para Autonomia Feminina da Secretaria de Políticas para as Mulheres do Ministério da Cidadania, Tatau Godinho, declarou que a luta contra a violência continua norteando a pauta do movimento feminista desde o início da década de 80. De acordo com o Mapa da Violência 2015, entre 1980 e 2013, foram registradas 106.093 mortes de mulheres, vítimas de homicídio. O número de vítimas passou de 1.353 mulheres em 1980 para 4.762 em 2013, um aumento de 252%. Segundo Godinho, o aumento das agressões e assassinatos de mulheres é explicado, em parte, pelo aumento do número de denúncias e pela reação machista à popularização do feminismo. “A reação conservadora é negativa e violenta”, o que para ela demonstra tensão entre o avanço das reivindicações femininas e as forças mais tradicionais do machismo.
A socióloga e educadora Carmen Silva, da organização SOS Corpo e da Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), diz que o conservadorismo está crescendo em alguns setores. “A gente há muito tempo não via tantos projetos contra os nossos direitos no Congresso e tanto descaramento na defesa de pautas homofóbicas, misóginas. Isso também é visto na mídia e nas igrejas”, avalia, lembrando de projetos como o que restringe o conceito de família ao núcleo formado a partir da união entre o homem e uma mulher.
Desde a criação da Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, em 2005, foram registrados mais de 4,5 milhões de atendimentos. No primeiro semestre de 2015, a Central realizou 364.627 atendimentos, uma média de 2.025 atendimentos por dia. Destes, 32.248 foram relatos de violências físicas e psicológicas sofridas por mulheres.
Tatau acredita que já há o entendimento, entre grande parte das mulheres, de que não é possível lutar contra a violência no âmbito privado, em casa. “Elas já sabem que precisam denunciar”.
Segundo a secretária, políticas públicas como a Lei Maria da Penha – que aumentou o rigor das penas sobre crimes de violência doméstica e familiar –, os juizados especiais de atendimento à mulher, os centros de atendimento e a Casa da Mulher Brasileira incentivam muitas brasileiras a terem coragem de denunciar. “São elementos que fazem muitas ficarem mais seguras para denunciar, pois vão encontrar apoio”.
A ativista Carmen Silva avalia que na última década o país avançou muito no aparato legal. “Temos uma das melhores legislações do mundo sobre a violência contra a mulher. O que precisa avançar é na estrutura para garantir os direitos”. Carmen diz que o número de delegacias, abrigos e juizados para lidar com a violência contra as mulheres ainda é muito inexpressivo, aquém da necessidade do país.
Segundo ela, a divulgação da Lei Maria da Penha foi muito eficiente nos últimos anos, mas precisa se transformar em mais serviços, em especial para as mulheres de baixa renda. “Todo mundo conhece a lei. Mas isso tem favorecido especialmente às mulheres mais esclarecidas, dos setores médios, que têm mais recursos financeiros, a maioria branca, elas têm mais possibilidade de sair do ciclo de violência. As agressões contra as mulheres brancas diminuiu, mas contra as negras, que estão na base da pirâmide e têm menos acesso à informação, ao trabalho e aos serviços públicos, não”.
De acordo com os dados registrados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Sistema Único de Saúde (SUS), duas em cada três vítimas de violência em 2014 foram mulheres que precisaram de atenção médica por violências domésticas, sexuais e/ou outras. A cada dia de 2014, 405 mulheres procuraram atendimento em unidades de saúde por alguma violência sofrida.
Natália Fontoura, técnica do Ipea, aponta que as mulheres encontram uma série de barreiras no mercado de trabalho apesar de estudarem mais que os homens. “Elas têm mais dificuldade de ingressar no mercado. Em torno de 50% das brasileiras estão ocupadas ou procurando emprego, enquanto a taxa de participação dos homens é de 80%. É uma distância muito grande”. Segundo estudo da Organização para Cooperação do Desenvolvimento Econômico (OCDE), o salário médio de uma mulher brasileira com educação superior representa 62% do de um homem com a mesma escolaridade.
Ainda conforme o Ipea, a renda média dos homens brasileiros, em 2014, chegava a R$ 1.831,30. Entre as mulheres brancas, a renda média correspondia a 70,4% do salário deles, R$ 1.288,50. Já entre as mulheres negras, a média salarial era de R$ 945,90.
O dia 8 de Março é uma data de luta pelos direitos da mulher e, como não poderia deixar de ser, dentro de um contexto de luta de classes representa o Dia Internacional da Mulher Trabalhadora, uma vez que no capitalismo estão as bases da opressão de gênero.
O Dia Internacional da Mulher Trabalhadora originou-se a partir da moção encaminhada pela líder comunista Clara Zektin, já no início do século XX, relatando no Congresso da II Internacional o esmagamento, em 1857, das 129 operárias têxteis de uma fábrica de Nova Iorque nos EUA, que foi incendiada com as operárias trancadas em seu interior. Sua moção recebeu o apoio de Lênin e de outros revolucionários russos presentes no congresso e a data passou a representar a luta de todas as mulheres trabalhadoras, como publicou o INVERTA nº 457. Por isso não devemos desvincular do conceito de emancipação da mulher do conceito da luta de classes, pois leva à perda do potencial revolucionário presente nas lutas das mulheres, expresso simbolicamente nesta data.
Berta Cáceres, presente!
Almeida Rodrigues
Fonte: https://inverta.org/jornal/edicao-impressa/482/movimento/dia-internacional-da-mulher-e-de-resistencia-e-luta
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